A presidente
Dilma Rousseff tem 20 dias para romper o isolamento político,
reestruturar seu governo e apontar caminhos para sair da recessão
econômica. Caso contrário, será difícil manter a governabilidade e
evitar a escalada da insatisfação popular.
O diagnóstico e o ultimato foram repetidos, com pouca variação, por
alguns dos principais personagens da crise política que vive o governo
durante a concorrida festa de 70 anos de Marta Suplicy, na noite de
ontem, sexta-feira, em São Paulo - que, além de festa de aniversário,
teve um clima de "cerimômia do adeus" da senadora depois de 35 anos no
PT.
De saída do PT e uma das vozes mais críticas a Dilma, Marta reuniu o
vice-presidente Michel Temer, o ex-presidente José Sarney, o ministro
Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, e o ministro de Minas e
Energia de Dilma, Eduardo Braga.
Nas rodas de conversas, esses protagonistas discutiam abertamente com
senadores e deputados governistas e de oposição, advogados e empresários
os cenários possíveis para o governo.
"Ela tem de 15 a 20 dias para sair da encruzilhada e apontar o caminho
que seu governo vai seguir nos próximos três anos e 9 meses. Caso
contrário, será difícil assegurar a governabilidade", avaliava um dos
responsáveis pela articulação política atual.
O prazo coincide com a data da segunda onda de protestos nacionais
contra Dilma, marcada para 12 de abril. Políticos de vários partidos
avaliam que a presidente terá de apresentar um conjunto de medidas mais
concretas antes disso e pedir um "voto de confiança" à população.
"Isso terá de ser feito sem tergiversar em assumir os erros", ponderava um experiente político na festa da senadora dissidente.
O próprio quórum expressivo que Marta conseguiu reunir numa semana
especialmente tensa para o governo mostrou, no entender de vários dos
convidados, que existe um grupo de políticos conversando para tentar
reconstruir pontes rompidas com a agudização da crise.
A anfitriã circulou a noite toda entre as mesas tomadas por cerca de 300
pessoas no salão de festas em um prédio nos Jardins. Elegante em um
vestido branco com corpete bordado em pedrarias e saia evasé do
estilista Samuel Cirnansck e sem descer do salto agulha Louboutin
altíssimo, Marta explicava a ausência de petistas entre os convidados.
O único petista presente, o senador Delcídio Amaral (MS), demonstrava
certo constrangimento e procurava fazer graça com a situação: "O pessoal
deve estar chegando". Marta disse que convidou a bancada, mas senadores
petistas diziam nos dias anteriores não terem sido chamados.
Uma ausência foi a mais comentada: a do ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva. "Não o convidei. Na última conversa que tivemos, disse a ele
que iria buscar o meu caminho. Lula é o maior estadista que este país
tem, mas agora não faria sentido estar aqui", disse a senadora à
reportagem.
Ela repassou calmamente todas as etapas de seu afastamento em relação ao
partido e a Dilma. Afirmou que desde o início de 2014 viu com "clareza"
que a presidente não teria condições de conduzir a economia e a
política num novo mandato, o que a levou a tentar construir -
primeiramente com aval discreto do próprio Lula - um movimento pela
troca de Dilma pelo antecessor.
Diante do malogro da tentativa e do agravamento da crise, ela não mede
palavras em decretar: "O PT acabou. Aquele partido que eu ajudei a
fundar fazendo reuniões na minha casa, indo de porta em porta, em
assembleias, ele não existe mais".
O novo caminho de Marta ficou evidente na festa pela presença maciça do
comando do PSB, sigla à qual a senadora se filiará nos próximos dias. O
vice-governador de São Paulo, Marcio França, o presidente da sigla,
Carlos Siqueira, e o governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg,
demonstravam entusiasmo com a candidatura de Marta à Prefeitura de São
Paulo no ano que vem.
O ingresso numa legenda de oposição a Dilma e próxima ao PSDB no Estado
levaram Marta, fundadora do PT, a se aproximar dos tucanos. Ela convidou
o governador Geraldo Alckmin, que não compareceu mas pediu ao vice que o
representasse.
A senadora sabe que terá de se reinserir no eleitorado "azul" da cidade,
ironicamente aquele composto pela classe social a que ela mesma sempre
pertenceu e que era predominante na festa de sexta-feira.
"Eu sei que haverá a necessidade de reconstruir as relações. A maneira
de fazer isso será explicar com clareza que, como governante, fiz uma
opção clara pelos que mais precisam, e que ela é a correta para o
conjunto da cidade", disse Marta.
As críticas a Dilma rivalizavam, entre os convidados, com as queixas
dirigidas ao prefeito Fernando Haddad. A todas, Marta não hesitava em
fazer suas próprias.