VEJA obteve a íntegra do depoimento prestado pelo ex-presidente em 9 de dezembro de 2014. Inquirido sobre “empréstimo” de 7 milhões de dólares ao PT, ele transferiu a responsabilidade por eventuais irregularidades a Delúbio Soares e João Vaccari
Na
sede da Polícia Federal, em Brasília, tudo foi planejado para oferecer
ao visitante o conforto a que ele tem direito como ex-presidente da
República e, principalmente, a mais absoluta discrição. Lula pediu, e
foi atendido, para depor em um local reservado. Os policiais escolheram
uma sala contígua ao gabinete do diretor-geral. Foi assim que, na
terça-feira 9 de dezembro de 2014, Lula prestou seu depoimento. O
ex-presidente, acompanhado de três advogados, entrou pela garagem do
prédio e usou o elevador privativo do diretor para levá-lo ao 9º andar.
Com a solenidade, o respeito e a deferência que merece um ex-mandatário
da República, depois de várias tentativas em vão, a polícia finalmente
conseguiu interrogar Lula sobre uma passagem ainda obscura do mais
rumoroso caso de corrupção a estourar durante o seu governo, o mensalão.
Desde que deixou o governo, em 2010, pouca coisa se ouviu do
ex-presidente sobre o escândalo. Seu principal ministro, seus amigos
mais próximos, a cúpula de seu partido e muitos dos parlamentares que
apoiavam seu governo foram condenados à prisão. Embora, em última
instância, fosse o principal beneficiado pela compra de apoio
parlamentar, o ex-presidente nunca foi acusado de nada. Em 2005, Lula se
disse traído quando se revelou que o tesoureiro e amigo Delúbio Soares e
José Dirceu, seu braço-direito, haviam montado uma rede clandestina de
captação de dinheiro para subornar parlamentares e sustentar as
campanhas políticas do PT. Preservado por todos os que sabiam de seu
envolvimento direto no mensalão, Lula escapou do processo judicial. Ele
passou todo o seu governo negando a existência do esquema. Quando desceu
a rampa do Palácio do Planalto, porém, prometeu que contaria "a
verdadeira história do mensalão". Diante dos policiais federais em
Brasília, Lula voltou à versão que, oficialmente, sustentou.
VEJA teve acesso à integra do depoimento, um documento de valor
histórico inestimável em que Lula, pela primeira vez, formaliza o que
tem de importante a dizer sobre o caso: absolutamente nada. São quatro
valiosas páginas que sintetizam a natureza do ex-presidente diante de
uma situação embaraçosa - ele, como sempre, jura que não sabia de nada,
que nunca se envolveu com os malfeitos de seu governo e, quando
confrontado com os fatos, aponta o dedo para terceiros para salvar a
própria pele. Durante pouco mais de uma hora, Lula driblou as 28
perguntas elaboradas previamente e lidas por um delegado convocado
especialmente para a ocasião.